terça-feira, 26 de julho de 2011

A Vingança do Vento

            Quem mora no centro-oeste e já teve pelo menos uma hortinha de fundo de quintal sabe: agosto é o mês dos ventos fortes. Era o maior inimigo das mulheres, até que Isaac Newton descobriu a gravidade. Depois disso, o Vento passou a andar por aí, cabisbaixo, quase esquecido, dentro de pastéis de bares sombrios e na companhia de coxinhas de reputação duvidosa. Mas, quando agosto chega, é hora da sua vingança. Nem o laquê de Hebe Camargo pode com ele. Aliás, dizem que ela quis economizar na última cirurgia e veio a Brasília. Bastou cinco minutos com a cara para o vento para ela ficar com aquele sorriso parecendo o Curinga, uma gracinha. Pois fiquem sabendo: venta tanto por aqui em agosto que se a cabeça de o Neymar estiver alinhada em noventa graus em relação à direção do vento, é capaz de o jogador ir parar em Cabo Verde. Mais ou menos onde aterrissaram os pênaltis cobrados pelo Brasil.

domingo, 24 de julho de 2011

A Construção do Universo Segundo o PR



– Mandou chamar, Todo Poderoso?
– Mandei, Waldemar. Eu estava pensando em criar outro paraíso, o jardim do Éden.
– Grande idéia, chefe. E eu tenho a pessoa certa para o serviço.
– Mas olha lá, hein? O orçamento está apertado e o Diabo está de olho – disse batendo três vezes na madeira – É só um jardinzinho em um pequeno planeta, coisa pouca, apenas para dois indivíduos a minha imagem e semelhança morar.
– Deixa comigo. O Nascimento é o cara certo para ser seu mestre-de-obras.
– Tudo bem, gostei do nome, monta um cronograma.
No primeiro dia.
– Seu Waldemar, o que vocês fizeram? Era só para criar o dia e a noite.
– Caro Jeová, porém só dia e noite ia ficar meio sem graça e muito previsível. A gente pensou em acrescentar um satélite natural ao planeta, assim teremos uns eclipses de vez em quando.
– Boa! Gostei, pode continuar. Não sei como eu, sendo o Todo Poderoso, não tinha pensado nisso antes.
No segundo dia.
– Alô!
– Seu Waldemar, você terminou de separar a água da terra.
– Olha, seu Poderoso. O negócio não é fácil assim não. Separar a gente até separou, só que deu uns vazamentozinhos que dividiu o oceano em sete, mas a gente já está providenciando.
– Não seria porque você contratou a empresa do seu primo ao invés da melhor?
– Bem...
– Não minta para mim, eu estou em todos os lugares.
– Desligou na minha cara, mas que sujeitinho! Se ele sabe de tudo para que me ligar? Agora seu Lucival da Costa Neto, você fez essa cagada, você arruma. Acelera aí que o Homem está nervoso.
No terceiro dia.
– Alô!
– Seu Waldemar, cadê a terra seca e as árvores frutíferas?
– Ô do poder, deixa comigo. Você não ia querer criar um jardim fraquinho desses, o que vão dizer do senhor no futuro?
– O que vão dizer eu já sei.
– Ah, é! Pois se o senhor sabe, nem preciso falar, mas vamos incrementar isso daqui, vai ter planta de tudo quanto é jeito, contratamos uma empresa de paisagismo de primeira.
– A empresa da sua mulher.
– O Seu Poderoso, o senhor é muito apegado em detalhes, mas olha o resultado.
– Eu só vejo escuridão.
– Não, eu estou falando do futuro, o senhor não vê o futuro? Então.
– Talvez nem eu viva tanto para ver isso, apressa esse serviço, Zé!
– Falando em Zé, o Zé Bigode está querendo participar também.
– Pensei que ele ia sossegar com a presidência do senado.
– Você sabe como ele é.
– Não me incomode com detalhes, eu quero é essa obra pronta logo.
No quarto dia.
– Alô!
– Waldemar, era para criar apenas o sol, a lua e algumas estrelas.
– Ô chefia, sem algumas galáxias, isso ia ficar muito pobrezinho.
– Algumas? Vocês criaram mais de 200 bilhões de galáxias. Eu só vou colocar duas pessoas lá, você já ouviu falar em custo x benefício?
– A gente ia criar só umas três, mas aí vieram seu Bigode, Renan e até o duplo ‘L’ para dar pitaco.
– Ai, ai. Quando Lúcifer veio com a idéia de criar um senado para mediar nossas brigas, eu deveria ter desconfiado.
No quinto dia.
– Alô, chefia! Já sei, vocês está ligando para me cobrar o andamento da Obra. Está uma beleza.
– Waldemar, era para criar uns peixinhos.
– Pô, chefe! Mas você tem de concordar comigo que essas baleias são umas simpatias.
– E ainda por cima mamíferos. Era para criar os mamíferos na terra.
– Eu já pensei nisso, Seu Poderoso. Depois elas migram.
– E o orçamento para isso?
– Bom chefe, vai custar um pouquinho a mais.
– Sei e as aves? Era para ter uns dois papagaios e nada mais, como você me explica os pterodátilos?
– Mas do Poder, você não pode querer as coisas logo, tem toda uma evolução até chegar lá. Você acha que criar é fácil?
– Eu devia ter estalado meus dedos.
– O que o senhor disse?
– Deixa para lá. Termina logo isso aí.
No sexto dia.
– Alô!
– Waldemar, eu não falei para você fazer só um cachorro?
– É verdade.
– E o que é isso aí?
– Um rinoceronte.
– Waldemar, para que eu quero esse monstro?
– Ele leva muitas vantagens sobre o cachorro.
– Que vantagens, Waldemar?
– Ora, para vigiar a casa. Com uma blindagem dessas e esse chifre enorme, ladrão nenhum vai se atrever a invadir o local.
– Nem os donos, o rinoceronte é um animal selvagem.
– Ah, é! Então vamos soltar na floresta.
– Que floresta, Waldemar? Era só um jardim. Jardim, Waldemar! E outra coisa, só vão ter dois indivíduos, para que um animal de guarda?
– Tenho de admitir, o senhor sabe tudo.
– Fuuuuuuuuhhhhhhhhhh!
– Ô Poderoso, suspira mais devagar. Olha, seu suspiro causou um vendaval aqui. A gente vai ter de refazer umas coisinhas, talvez fique um pouco mais caro.


sexta-feira, 8 de julho de 2011

Piratas do Caribe em Brasília

            Ana Clara me pediu para levá-la ao Piratas do Caribe, apesar de ter torcido o pé e estar usando bengala, pai é pai. Fui. Chegando ao shopping, Ana Clara quis tomar sorvete e logo naquela sorveteria mais cara que serve um copinho minúsculo junto a um guarda-napo preto imenso. Bem que poderia ser ao contrário, afinal eu estou pagando o sorvete ou o guarda-napo?
            Com muita dificuldade, fui me arrastando para a fila, uma mão na bengala, outra no sorvete e uma terceira na Ana Clara, não me perguntem como, pai é pai (*). Esperando a fila andar, um garotinho na frente ficou olhando para a minha bengala e perguntou para a mãe:
            ─ Mãe, esse aí atrás é um dos piratas?
            ─ Não, meu filho.
            ─ Tem certeza?
            ─ Tenho.
            ─ Mas eu quero brincar com ele.
            E eu olhando a discussão e pensando: “vou dar uma bengalada nesse moleque”.
            ─ Mas, mãe, eu quero brincar com ele.
            ─ Não pode, já falei, ele é um pirata falso.
            ─ Pirata falso ─ disse se virando para mim e acertando um bico bem no meu tornozelo machucado.
            Com a dor, eu me curvei, acabei acertando a cabeça no sorvete e com o guarda-napo colado no meu olho direito. Enquanto eu via estrelas, um outro menino passou me olhando.
            ─ Pai, estão encenando aqui.
            ─ É, filho. Eu nunca tinha visto expressões faciais tão realistas. Que ator! Parece até que está sofrendo.
           
(*) Aprendi observando o Ricardo levar os tri-gêmeos para passear.

domingo, 3 de julho de 2011

Quem com o Ferro Fere

      Passear com a filha no shopping ao domingo é um evento cultural. Aprendemos muito em apenas uma voltinha. A primeira coisa que descobri é que o preço do cinema parece não ter complexo de grandeza. A segunda é sempre usar o guardanapo para limpar o banco antes de sentar, ou seu traseiro vai ficar brilhando mais que o traje da destaque da alegoria principal do maior carro a desfilar na avenida no carnaval.
      Como Ana Clara anda mais chata para comer que vegetariano em churrascaria, deixei-a escolher onde e local para criança é Mac Donalds. Eu odeio tudo isso. Mas como ela passou nas provas, vamos lá!
      – Eu queria um Mac Lanche Feliz e uma promoção do Big Mac.
    – Por vinte e nove centavos, o senhor tem direito a uma batata-frita e refrigerante grandes – disse caprichando no ‘s’ final.
      – Não, obrigado.
      – Tem certeza? São só vinte e nove centavos – sorriu.
      – Tenho – rosnei.
     Por que todo vendedor acha que nós mudaremos de idéia se ele insistir? “Ah, claro. Ainda bem que o senhor repetiu, eu tinha dito não? É que meu cérebro nunca pega de primeira, sabe como é, igual carro velho”.
      – O senhor ganha alguma comissão por venda aqui no Mac Donalds? – perguntei.
      – Não.
      – Claro que ganha.
      – Não ganho nada a mais.
      – Vai, confessa! Você queria me vender a porção grande porque o gerente te dá um extra por isso.
      – Não, juro que não. Meu salário é fixo, se você não acredita em mim, pode perguntar ao gerente.
      – Eu acredito, só repeti para você ver como é chato ficar fazendo a mesma pergunta várias vezes.
     Por sorte, o atendente já tinha me servido, ou meu sanduíche viria cuspido. Amo muito tudo isso, mas acho melhor não voltar.